Tuesday, 1 January 2008

à memória da minha tia Maria...

Tia Maria. Não é do licor que falo, mas de uma mulher: tia, mãe, força da natureza. As letras do abecedário são poucas e vulgares para a definir. Sempre firme, sempre forte - até na hora da partida. A tia gata: olhos verdes, cabelos brancos que o tempo lhe pintou. Linda. A pele macia das mãos muitas vezes aconchegaram-me o peito. A tia Maria desempenhou um papel importante na minha infância. Deixava-me fazer asneiras no apartamento da Constituição, levava-me a comida à boca. Eu recusava a comida à boca, e a tia Maria contava estórias. Eu, entretida rebolava o melhor esparguete cozido que alguma vez provei. Se agora fechar os olhos e fazer de mim o sentido do paladar aquela manteiga a escorregar no esparguete. delicioso. Animada, ouvia as estórias das duas irmãs, do saco de presentes, do bom e do mau. E à tarde embalava-me na cama, quentinha, fazia festas na testa e eu assim, criatura feliz, adormecia. Preparava-me o lanche, e cedia às minhas pressões infantis para ficar lá a dormir e crescer um pouco mais no novo dia. Verdes anos. Foram, de facto, verdes anos. No apartamento da Constituição. Aquela gargalhada safada da tia sacodia qualquer embaraço ou tristeza. Tinha a resposta pronta na língua. Era uma mulher a sério. E por ser tão grande e tão mulher, no regaço educou a filha de igual modo - a minha tia Maria dos Anjos. Dos Anjos. Sempre amiga, sempre fogo, sempre terna, sempre humana. Sempre forte.

A tia Maria partiu conquistando o novo ano e esperou por mim. Ainda bem que te sussurrei ao ouvido o quanto te gosto, ao mesmo tempo, que te descrevia a linha do Douro que espreitava pela janela, a sorrir para ti.

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